O autismo é um distúrbio de desenvolvimento que é definido a partir de critérios comportamentais, uma vez que marcadores biológicos não são conhecidos. É um transtorno vitalício caracterizado por falhas na interação social, na comunicação e a presença de repertório restrito de atividades e interesses.
A linguagem nos quadros autísticos tem sido alvo de várias pesquisas e o foco da maior parte delas é a pragmática. Resultados contraditórios de pesquisas feitas sobre o desenvolvimento gramatical entre sujeitos no espectro autístico têm sido comuns.
Há pesquisadores que acreditam que o desenvolvimento gramatical no espectro autístico é relativamente preservado,
enquanto outros já documentaram déficits gramaticais em suas investigações.
De maneira geral, esses estudos foram feitos sob a perspectiva linguística, que é uma das formas de se avaliar a metalinguagem.
Dentro desta perspectiva, a metalinguagem é secundária à linguagem propriamente dita, e a avaliação metalinguística tem seu foco na produção verbal de forma a encontrar indicadores no uso da linguagem para referir-se a ela mesma. Há, porém, a forma psicolinguística de avaliação da metalinguagem, em que se avalia a linguagem como um objeto cujas características podem ser investigadas por meio de monitoramento explícito
e consciente.
No discurso espontâneo, as crianças avaliadas muitas vezes não corrigem erros sintáticos por não estarem suficientemente motivadas a fazê-lo. Assim, os estudos que envolvem fala espontânea
devem ser complementados pelo exame da habilidade em correção sintática, em uma situação mais controlada. A
situação controlada de correção de erros sintáticos é feita por meio da abordagem psicolinguística, na qual o automonitoramento permeia o processo de correção e/ou julgamento de
frases agramaticais.
Na presente pesquisa, a consciência sintática, atividade de natureza metalinguística que envolve processos cognitivos de gestões conscientes dos aspectos linguísticos, foi a habilidade escolhida para investigação. A consciência sintática pode ser definida como a capacidade de refletir sobre a estrutura sintática da língua. Assim, avaliá-la envolve não somente detectar o nível de desenvolvimento sintático, mas principalmente verificar as habilidades de pensar e analisar sobre os aspectos estruturais da língua de forma consciente.
Uma das teorias que explicam o autismo é a da existência de falhas na coerência central entre os sujeitos no espectro
autístico. A coerência central refere-se ao estilo de processamento, focado em detalhes, proposto para caracterizar os
transtornos do espectro autístico(8). Em geral, essa habilidade é avaliada por meio de testes que requerem o desempenho em tarefas que exigem o estilo cognitivo de processamento focado
em detalhes (característico dos sujeitos no espectro autístico) em detrimento do estilo de processamento global (esperado entre sujeitos de desenvolvimento típico). As crianças com
autismo tendem a ter melhor desempenho em tarefas que necessitem processar partes de informações, sem terem de
levar em consideração o todo, quando comparadas às crianças de desenvolvimento típico.
Crianças do espectro autístico apresentam habilidade em perceber características individuais de uma entidade maior e montam quebra-cabeça com facilidade, mais orientadas pelas formas de cada peça do que pelas pistas contextuais da figura a ser montada. Nesta pesquisa, jogos de quebra-cabeça
com figura e fundo e apenas com fundo foram criados para a verificação do desempenho em coerência central, uma vez que as crianças do espectro autístico parecem ser capazes de montar facilmente o quebra-cabeça com apenas o fundo e sem a figura, tão bem quanto o quebra-cabeça com figura e fundo. As crianças com autismo não teriam dificuldade de se orientar pelas formas particulares de cada uma das peças (só
com o fundo e sem a figura), sem necessitar de pistas globais do contexto (com figura e fundo).
Os jogos de quebra-cabeça com fundo e figura e somente com fundo, criados para esta pesquisa, foram elaborados em uma versão computadorizada. Algumas das vantagens de se utilizar o computador tanto para testar quanto para tarefas de aprendizagem entre os sujeitos do espectro autístico foram mencionadas em pesquisas anteriores. A provável relação significativa de falhas na consciência sintática com déficits em coerência central, que é uma das teorias que explicam o autismo, poderá endossar a sintaxe como uma área descritiva do transtorno autista.
Além da verificação da relação entre o desempenho na consciência sintática e na coerência central, é importante que se estabeleçam parâmetros de desenvolvimento cognitivo que permitam entender os desempenhos destas crianças à luz do que é esperado em uma população de desenvolvimento típico.
Para isso, a inteligência não-verbal foi escolhida como variável a ser testada, por meio das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven – Escala Especial(16). Trata-se de um instrumento que mostrou ser eficaz na avaliação de crianças do espectro autístico.  que mede a inteligência não-verbal, uma vez que com a escolha de padrões geométricos a influência cultural e linguística são anuladas.
Da mesma forma, as tarefas de consciência sintática são de natureza metacognitiva, o que implica no acionamento de
alguns esquemas de ação que precisam ser planejados e autorregulados e que pendependa disponibilidade dos recursos executivo central. Desta forma, é esperado que as crianças do espectro autístico apresentem desempenhos em consciência sintática correlacionados positivamente aos desempenhos em inteligência não-verbal.
Para que possam caracterizar os quadros autísticos, as falhas na consciência sintática deverão apresentar uma relação significativa com os critérios que definem o autismo: prejuízos em desenvolvimento social, comunicação geral e interesses restritos, e comportamentos estereotipados. No caso específico dessa pesquisa, foi utilizada a Entrevista Diagnóstica de Autismo Revisada – ADI-R. Trata-se de um instrumento elaborado para eliciar uma gama completa de informações necessárias para produzir o diagnóstico de autismo, como também para avaliar qualitativamente o comportamento atual e auxiliar na avaliação de transtornos correlatos referenciados como transtornos do espectro autístico.

REFERÊNCIA:

Consciência sintática: prováveis correlações com a coerência central e a inteligência não-verbal no autismo

Cristina de Andrade Varanda1
Fernanda Dreux Miranda Fernandes

 

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